Em 25.9.2019, o Professor Doutor Henrique Arake apresentará o seu paper “Despacho Saneador e Assimetria da Informação” escrito em co-autoria com o Professor Doutor Ivo Teixeira Gico Jr. publicado na Economic Analysis of Law Review para discussão com os integrantes do grupo.
Conforme as regras de participação no grupo, todos os integrantes do grupo deverão enviar uma resenha crítica de todos os papers apresentados em cada reunião, com os pontos fortes e fracos do trabalho.
Para facilitar as comunicações entre os integrantes, pedimos a gentileza de que vocês postem as suas críticas como comentários ao post correspondente ao paper em questão. Os comentários passarão por uma avaliação antes de serem disponibilizados ao público.
Henrique Arake e Ivo Gico Junior buscam investigar a importância do despacho saneador na gestão eficiente de processos judiciais durante a fase de instrução. A análise parte da premissa de que existe uma assimetria de informações não apenas entre as partes que estão em litígio, mas também entre as partes e o juiz.
Segundo a proposta apresentada, o despacho saneador pode ser utilizado como um instrumento para solucionar, ou ao menos, minimizar a assimetria de informações identificada. O objetivo é incrementar o conhecimento das partes sobre as questões controversas, o direito a ser aplicado ao caso concreto, o material probatório a ser investigado, permitindo assim um cenário mais favorável para a solução do caso, seja via conciliação, ou mesmo através de sentença.
Três aspectos me chamaram atenção, conforme explico a seguir:
1) Em determinada passagem, o artigo propõe o seguinte: “Nosso modelo indica que um despacho saneador, que não apenas trate de preliminares, mas também informe às partes os pontos de fato e de direito que são controversos, na opinião do julgador, pode ser suficiente para se evitar a alocação de recursos pelas partes na tentativa de provar algo já incontroverso e, assim, reduzir o tempo da solução da controvérsia.” Entendo inadequado utilizar a expressão “nosso modelo” nesse aspecto, considerando que o art. 357 do CPC já estabelece todos os pontos que devem ser esclarecidos no despacho saneador.
Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo:
I – resolver as questões processuais pendentes, se houver;
II – delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos;
III – definir a distribuição do ônus da prova, observado o art. 373 ;
IV – delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito;
V – designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.
A abordagem mais adequada deveria revelar, na verdade, que o modelo previsto pelo CPC é adequado e deveria ser efetivamente utilizado pelo juiz, conforme comprovado através das inequações apresentadas na seção correspondente do artigo.
2) Em determinado momento, os autores afirmam que: “Apesar do teor inequívoco do dispositivo, nossa experiência demonstra que o despacho saneador não segue o que dispõe o art. 357/CPC, sendo ele utilizado pelo juiz não como um instrumento de saneamento e organização, mais mero despacho burocrático em que se pergunta às partes que provas desejam produzir. Via de regra, não se informa as questões de fato que permanecem controversas (inc. I), não se aloca o ônus da prova acerca dos fatos controversos supostamente elencados no inc. I (inc. II) e não se delimita o direito aplicável ao caso concreto que, obviamente, deveria guiar a questão probatória (inc. III).” Acho que esse tipo de afirmação não poderia vir apenas da “experiência” dos autores. Trata-se de um artigo científico. Assim, alguma pesquisa poderia ser feita para efetivamente comprovar que os juízes não utilizam o despacho saneador conforme determinado pelo Código de Processo Civil. Caso houvesse a pesquisa, poderíamos afirmar com segurança que o problema não está na legislação (que ao que parece, está adequada), mas sim a aplicação da legislação pelo juiz.
3) Por fim, me parece que a grande utilidade da reflexão processual sob as luzes da AED consiste na proposição de novas ferramentas que busquem promover eficiência, segurança jurídica, etc. Nesse aspecto, o artigo não apresenta novidades, propostas de aperfeiçoamento da legislação. Apenas reforça a necessidade de um despacho saneador completo, que já está previsto pelo CPC, utilizando ferramentas matemáticas para comprovar o que a própria legislação já estabelece.
O ponto central do artigo diz respeito à gestão eficiente do processo, a qual poderia produzir mais serviços adjudicatórios com os mesmos recursos disponíveis, resolvendo mais controvérsias, liberando, ao fim, recursos para outras atividades. Aferir a eficiência é tarefa contínua de avaliação de custos e benefícios, buscando maximizar os benefícios e minimizar os custos envolvidos. Deste modo, o ponto de debate seria mostrar como a fase de instrução processual, mais propriamente o despacho saneador, pode ser utilizado pelo magistrado para reduzir o hiato de expectativas entre as partes, ou seja, a assimetria de informação, possibilitando reduzir os recursos alocados pelas partes e pelo próprio juiz na solução da controvérsia.
Como poderia o juiz diminuir a assimetria de informações, o hiato de expectativas (entre os desejos de autor e réu), propiciando acordos e redução de gastos? A resposta, segundo o autor, estaria na eficiência do despacho saneador para redução da assimetria, propiciando a fixação de pontos controvertidos de forma clara, aumentando as chances de visualização do litígio de forma clara pelas partes.
Sabemos que são as ideias simples, como as tratadas no artigo, que trazem verdadeiras revoluções. E de fato o ponto central do artigo traduz em verdadeira economia processual, em prol da eficiência na prestação jurisdicional, redução de custos, e celeridade na resolução de conflitos.
Nas trocas voluntárias, maior a chance de acordo quanto maior for a coincidência das estimativas das partes, somente existirá acordo se houver um excedente cooperativo a ser distribuído.
Apresenta modelo em que as variáveis probabilidade, utilidade, custos e acordo se relacionam com a possibilidade de haver litígio e o hiato de expectativas, ou seja, a distância entre a avaliação da chance de êxito pelo autor e pelo réu.
Assevera que “se a regra jurídica aplicada a cada caso varia com o posicionamento ideológico do magistrado (subinvestimento em capital jurídico), e a distribuição de casos é feita de forma aleatória” então seria difícil estimar a probabilidade subjetiva atribuída a autor e réu.
O que seria propriamente este subinvestimento em capital jurídico? Caso houvesse uma preparação uniforme dos magistrados, com posicionamentos ideológicos convergentes, seria este um exemplo de investimento em capital jurídico? Mesmo que este investimento fosse feito, seria possível afirmar que a convergência e previsibilidade de entendimentos aumentaria?
O momento de produção de provas é essencial para formação de expectativas das partes, sendo necessário que o procedimento de revelação de informações privadas seja otimizado de forma a corrigir o otimismo excessivo das partes em relação ao resultado possível do processo, já que é desejável que a resolução das disputas seja feita por meio de acordo.
Em verdade, o despacho saneador ao invés de propiciar a redução do hiato de expectativas e da assimetria de informações entre parte e juiz, tornou-se mero ato burocrático em que se pergunta às partes quais provas desejam produzir, não sendo informadas as questões controversas, o ônus da prova, ou a delimitação do direito aplicável ao caso concreto.
Se o despacho saneador cumprisse seu papel, indicando qual regra jurídica aplicável ao caso concreto, quais fatos precisam ser provados e a quem cabe o ônus de fazê-lo, a gestão do processo seria mais eficiente e a probabilidade de acordo maior.
Após utilizar o modelo apresentado, conclui que existe ganho social em se investir em despacho saneador completo, o que não é realizado pois demanda do magistrado que ele estude o processo logo após a fase petitória. Diante da carga de trabalho exorbitante, é natural que este estudo não seja feito, sendo postergado para o final do processo, no momento do julgamento.
Texto: Despacho Saneador e Assimetria da Informação
Aluno: Dante Aguiar Parente
O artigo investiga a importância do despacho saneador na gestão eficiente do processo durante a fase de instrução. Para tanto, utiliza-se de uma abordagem matemática para demonstrar que a devida atuação do juiz, tal como determina o art. 357 do CPC, contribui para a eficiência processual ao diminuir os custos de todos os envolvidos. Dito de outra forma, caso o magistrado analise detidamente o processo e produza um despacho saneador que fixe os pontos controvertidos para a posterior produção probatória das partes, tanto o trabalho futuro do próprio magistrado, como o esforço das partes em produzir as provas serão diminuídos.
Os autores partem de uma condição de litigância que quando obedecida, induzem as partes para um litígio processual; caso contrário, há um incentivo para a realização de um acordo.
Ocorre que uma dessas condições de litigância é o hiato de expectativas entre as partes, ou seja, o desencontro de expectativas quanto ao resultado do processo. Ora, se o autor e réu acreditam piamente possuírem o direito ao bem da vida discutido, possivelmente não aceitaram fazer acordos, pois nesse caso estariam abdicando de parte de seu direito.
Esse desacoplamento de expectativas tende a ser maior no início do processo, quando o autor ainda desconhece as razões e provas defensivas a serem trazidas pelo réu. Contudo, com a apresentação da contestação, há uma evidente diminuição do hiato de expectativas, pois as partes já conhecem os temas postos em debate.
Cabe ao juiz, no momento do despacho saneador, fixar os temas controversos, temas esses que serão objeto de apreciação do juiz, seja uma questão de direito, seja uma questão de fato, o que poderá ensejar uma nova produção de provas.
Nesse sentido, um bom despacho saneador, ao fixar e delimitar os temas controvertidos entre as partes tende a tornar mais eficiente o processo judicial. Isso porque as partes não mais precisarão colher provas sobre temas não controvertidos, bem como o juiz, ao sentenciar, poderá se debruçar sobre uma quantidade menor de temas.
Explicado o que vem a ser o objeto do artigo, os autores passam então a se utilizar de ferramentas matemáticas para provar a eficiência processual de um bom despacho saneador. Para isso, usam de vetores para simbolizar o conjunto de argumentos e provas utilizados por autor e réu. Por sua vez, um bom despacho saneador provocaria a anulação de alguns argumentos e de algumas provas trazidas pelas partes.
Além disso, os autores trabalham com três funções vetoriais sobre os esforços pelos participantes do processo. (E) representa o esforço das partes em comprovar seus argumentos e prova quando houve um despacho saneador bem feito, (J) o esforço do juiz para realizar o despacho saneador e (V) o esforço do juiz para valorar os argumentos e provas na sentença.
Nesse sentido, os autores afirmam existir um ganho de eficiência quando o filtro proporcionado pelo despacho saneador provoca numa diminuição dos fatores a serem comprovados pelas partes e analisados pelo juiz. Ou seja, sem o filtro do despacho saneador há um esforço maior de todas as partes do que quando há a aplicação desse filtro. Matematicamente falando:
Etotal + Vtotal > Econt + Jtotal + Vcont
onde total = controverso + incontroverso.
Os autores concluem que quando tudo for controverso, o despacho saneador é ineficiente, pois haveria apenas um retrabalho do juiz para analisar tudo outra vez agora na sentença.
Passa-se as considerações sobre o artigo.
Por que foi adotada uma notação vetorial para o caso? Entendo que a ideia de usar vetores para o caso seria não misturar os esforços entre as diversas variáveis componentes de cada vetor (e.g. produção de uma determinada prova e o esforço de comprovação de um argumento jurídico).
Indago, pois quando os autores passaram a utilizar o modelo em um exemplo, ao final do artigo, simplesmente somaram as coordenadas vetoriais. Confira-se a seguinte passagem: “Como se viu, o custo do esforço para produzir provas e valorá-las caiu de R$ 5.773,00 para R$ 667,00 (…)”.
O problema que enxergo desse exemplo é o somatório das coordenadas vetoriais. Ora, se está utilizando uma notação matemática, dever-se-ia empregar a ferramenta adequada de cálculo de módulo vetorial (raiz quadrada do somatório do quadrado das variáveis) e não simplesmente somar os elementos do vetor. Matematicamente, essa passagem destacada no artigo está equivocada. Talvez seja melhor excluir o somatório dos vetores.
Caso assim não se entenda, a mesma passagem acima destacada está confusa, não explicitando diretamente como se chegou nos valores de R$ 5.773,00 e R$ 667,00. Dever-se-ia explicitar de onde saem os números 5773 e 667. Eu entendi que Econt(0, 500, 0, 50) + Vcont(0, 100, 0, 17) = 667 e Etotal(5000, 500, 1, 50) + Vtotal(100, 100, 5, 17) = 5773, mas não ficou clara na primeira leitura.
Outro ponto obscuro foi a definição dos vetores J e V. Não ficou claro, desde o início, que eles se referiam respectivamente ao esforço de realizar o despacho saneador e o esforço do juiz para valorar os argumentos e provas na sentença.
Pode parecer muito óbvio, mas a análise econômica do direto é um ramo com um teor muito mais voltado ao campo da Economia, do que propriamente do Direito. Repetir essa frase algumas vezes, com a devida vênia para a clara evidencia, faz alguns juristas se sentirem mais à vontade. Digo isso porque o domínio dos números parece ser diametralmente oposto ao domínio das palavras, universos diferentes, inatingíveis.
Meus mais sinceros parabéns aos Professores Henrique Arake e Ivo Teixeira Gico Jr., pela maestria com os dados, e pela simplicidade em estruturar, e principalmente transmitir, algumas equações aplicadas ao trabalho. Equações estas bastante simples, caso você seja da área das exatas.
O trabalho dos autores se presta a demonstrar a eficiência dos DESPACHOS SANEADORES, que segundo o entendimento doutrinário e normativo, é aquele tipo de decisão do magistrado que tem por objetivo esclarecer dúvidas, corrigir vícios, selecionar provas e agendar audiências de conciliação ou instrução. Esses despachos saneadores são uma das manifestações dos poderes de ofício que possui o Magistrado na condução do processo, e que por vezes permitem que sejam solucionados problemas sema necessariamente uma maior burocracia aplicada.
Nesse sentido, os autores asseveram que não é habito de todos os magistrados a utilização dessa modalidade de despachos, ou, quando utilizados, são feitos de formas ineficazes, levando-se em consideração o nível de solução de problemas e o índice de esclarecimento que faz às partes, o que pode ser auferido mediante a análise numérica dos dados colhidos, sob a metodologia da análise econômica do direito.
Dessa forma, o trabalho se presta a demonstrar como são importantes os despachos saneadores aplicados de maneira eficiente, e embora possam dispor de mais recursos nas fases iniciais do processo, principalmente na fase de conhecimento, podem economizar valores muito maiores na fase de sentença e de cumprimento da mesma, podendo o nível de economia superar o nível de gastos.
Primeiramente, os autores asseveram que os níveis de eficiência do ponto de vista judicial, baseado também sob aspectos da economia, é auferida num sistema de custo e benefício. Nesse sentido, a eficiência judicial significa, em síntese, a aplicação do direito no caso concreto, nos termos estabelecidos pela lei, além da resolução do processo de forma que se gaste a menor quantidade de recursos possíveis, sejam esses recursos o tempo, o pessoal, ou mesmo dinheiro.
Partindo dessa premissa, o objetivo é buscar métodos de maximizar essa eficiência, ou pelo menos aumenta-la de maneira satisfatória, e a ferramenta selecionada pelos autores é justamente o despacho saneador, que para eles, quando utilizado de forma satisfatória, evitará a alocação indevida de recursos, evitará a mobilização probatória para fatos já incontroversos, e, por conseguinte, reduzirá o tempo de solução da controvérsia.
Os autores ainda fazem uma análise a respeito das partes de um processo, seus motivos e garantias para litigarem, e quais seriam os objetivos que buscam. Além disso, também é feita uma análise da organização do processo, e das formas de atuação do magistrado dentro do procedimento judicial.
É a partir desse momento que os autores, se utilizando de equações matemáticas, buscam demonstrar objetivamente a eficiência de um cenário onde os despachos saneadores são utilizados com a maior eficiência, e de forma que os lucros ao sistema superam os gastos.
Talvez seja necessário fazer uma única crítica ao trabalho dos professores Henrique e Ivo, que diz respeito à uma certa dificuldade de leitura a partir do momento em que começam a inserir as equações nos textos. Pode ser que essa crítica seja até uma digressão pessoal referente a uma dificuldade particular com números, mas com as devidas vênias, o texto se inicia com um ar chamativo, confortável e bem encaminhado, porém, o artigo começa a integrar as leituras numéricas no corpo do texto, o que causa uma confusão aos leitores menos familiarizados.
Evidentemente que o trabalho costuma ser publicado em revistas especializadas, que certamente estarão preparadas para realizar uma análise mais clara das informações do texto. Mesmo assim, e no papel de leitor regular, bastante leigo na área econômica, os números me causaram uma certa estranheza, sendo necessária a repetição da leitura de alguns pontos do texto, para uma melhor compreensão.
Dito isso, vale salientar que essa foi apenas uma situação de desconforto em meio a uma excelente leitura, e que de forma alguma possa vir a prejudicar o conteúdo do trabalho. O Artigo dos professores Henrique e Ivo Gico é realmente bastante esclarecedor, e quando o leitor se familiariza com esse estilo de escrita, o conforto na leitura, que já citei anteriormente, retorna de maneira satisfatória.
Por fim, esse foi um brilhante trabalho, com uma pesquisa bastante legitimado na realidade, e que estabelece soluções práticas e facilmente aplicáveis ao atual contexto do judiciário brasileiro. Podemos dizer que os recursos do poder judiciário seriam muito melhor geridos caso os artigos científicos com esse tipo de teor se tornassem manuais. Análises claras, conclusões simples, e resultados comprovadamente eficazes.
O CPC de 2015 possui (ou tentou possuir) claro viés voltado ao alcance da efetividade do processo civil. Por meio de mecanismos para simplificar e agilizar o fluxo do processo, o CPC de 2015, de modo geral, conseguiu superar o CPC de 1973 no quesito eficiência.
A extinção do processo sem resolução de mérito e o julgamento antecipado da lide são mecanismos iniciais que já economizam o trabalho da máquina judiciária, se o processo, desde o seu início, já não tem condições de prosseguir.
Dando continuidade a esses instrumentos, o despacho saneador é o passo seguinte, ou seja, é a continuação dessa ideia de agilidade e busca de eficiência dos procedimentos. A meu ver, e no mesmo sentido da conclusão apresentada no paper, com a qual concordo, o despacho saneador antecipa a análise do juiz, no entanto, otimiza – e muito – seu trabalho posterior.
Uma vez analisado o processo pelo juiz antes da instrução, já ficam delimitados apenas o que deverá ser demonstrado pelas partes, de forma que tanto a atividade das partes de trazer aos autos os demais documentos necessários, quanto o trabalho do juiz ao avaliar as provas carreadas nos autos se tornará mais simples, uma vez que já direcionadas.
Caso o juiz não profira o despacho saneador, as partes irão trazer aos autos todos os documentos que entendem pertinentes, e mais outros que não têm relação com o processo mas, numa remota hipótese, acreditam “ajudar” no convencimento do juiz.
Tal hipótese não condiz com o atual espírito do CPC, a exemplo da decisão de emenda à inicial. Nesse caso, o juiz não pode simplesmente determinar a emenda à petição inicial, sem esclarecer o que entende dever ser modificado ou acrescentado. O despacho saneador funciona igual.
De outro lado, sem o despacho saneador, o juiz, ao receber todas as provas sobre todas as questões levantadas, terá muito mais trabalho de separar aquilo que se aproveita do que não se aproveita no âmbito do processo. Haverá perda de tempo desnecessária e, consequentemente, perda de eficiência.
Sem o saneamento do processo, as provas estarão confusas e embaralhadas e, muitas vezes, protelatórias e desnecessárias, o que não é o intuito do processo.
Nesse panorama, salvo os casos em que, de fato, tudo for controverso, ou tudo for incontroverso, há nítido ganho de eficiência com o despacho saneador e no esforço de o judiciário adiantar a análise do processo para os ganhos posteriores.
O artigo redigido pelo professor Henrique Arake e pelo professor Ivo Gico tem como principal objeto de pesquisa a assimetria de informação e o mau uso que envolve o despacho saneador. Primeiramente o artigo busca desenvolver argumentos e fatos que envolvem o despacho saneador, com um fim de demonstrar que o Poder Judiciário poderia, com um melhor uso do instituto do despacho saneador, otimizar os resultados, gerando processos menos morosos e ultimamente mais com menores custos.
Dentro do código civil temos o seguinte dispositivo:
Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo:
I – resolver as questões processuais pendentes, se houver;
II – delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos;
III – definir a distribuição do ônus da prova, observado o art. 373 ;
IV – delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito;
V – designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.
Ainda vale mencionar o seu parágrafo primeiro que diz:
§ 1º Realizado o saneamento, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se torna estável.
O dispositivo em questão regula o que deveria ser o saneamento e organização do processo, e ultimamente os professores Henrique Arake e Ivo Gico estão demonstrando que se o despacho saneador fosse feito pelo juiz antes da fase instrutória, levando em consideração o risco que é inerente a qualquer processo, o que se teria era uma maior segurança jurídica, visto que o juiz iria expor as partes a probabilidade de sucesso e demonstrar as repercussões que o mesmo ira ter, fazendo com que dessa forma um maior número de acordos fossem feitos e os processos, consequentemente, fossem menos morosos.
Fala-se no artigo também em uma antecipação de esforços e custos, visto que atualmente a maioria do trabalho feito pelo juiz é acumulado para um momento posterior, onde ele deve analisar o mérito e gerar uma sentença. Os autores defendem que não seria um aumento de custos, e sim uma antecipação, visto que os juízes terão de analisar o processo independentemente da fase, porém como os processos no Brasil são extremamente demorados, na realidade, eu acredito que após o juiz analisar todo o caso concreto e expor às partes a chance de sucesso da forma adequada, ou seja, na fase saneatória e mesmo assim não houvesse acordo o que aconteceria, inevitavelmente, é uma repetição dos esforços e gastos já realizados pelo juiz quando o mesmo for analisar o processo novamente para criar uma sentença.
Ultimamente, o problema se relaciona com a falta de segurança jurídica existente no Brasil, que poderia ser diminuída consideravelmente se o artigo 357 do CPC fosse cumprido pelos juízes e as ideias expostas pelos professores Henrique Arake e Ivo Gico fossem seguidas. Dessa forma, as partes saberiam aquilo que ainda há controvérsia no processo e portanto, direcionariam melhor suas forças e recursos para aqueles que são os fatos controversos, evitando gastos desnecessários e mostrando as partes as provas que foram aceitas e aquelas que ainda precisam ser produzidas para que haja um melhor livre convencimento do juiz, sendo que dessa forma a assimetria de informação não seria mais biunívoca, entre as partes, mas sim tripartite com a participação do magistrado.
Portanto, um despacho saneador desejável é aquele que o esforço para exercer o juízo de controvérsia é inferior ao esforço para se produzir e valorar provas sobra aqueles fatos incontroversos, gerando assim um menor desperdício de recursos pelas partes ao produzirem provas inúteis e melhorando a segurança jurídica e eficiência do processo.
Os professores de Direito do UniCEUB Ivo Gico e Henrique Arake apresentaram um paper tratando sobre a efetividade do despacho saneador previsto no art. 357 do NCPC, caso venha a ser cumprido conforme expressamente previsto na legislação.
A premissa do artigo é de que a atuação do magistrado nos exatos termos da lei quando da confecção do despacho saneador, tem grande potencial de reduzir, senão anular, a assimetria de informação entre as partes litigantes. Essa equalização de expectativas levaria a um ganho considerável de economia não apenas nos atos oficiais como também pelas partes que deixam de produzir provas contra fatos incontroversos.
O problema é que a prática proposta começa encontrando forte resistência dentro do próprio judiciário. A praxe é que o magistrado opte por definir pontos como os de controvérsia apenas no momento de julgamento da ação, ou seja, o despacho saneador se mantém no exercício utilizado pelo CPC/73 que meramente determinava a produção de provas que as partes achassem devidas.
Ao que tudo indica, a opção é feita devido ao fato de que, para os magistrados, definir esses pontos no momento processual do despacho saneador seria um retrabalho, visto que, teoricamente, seria necessário retomar essas questões quando da sentença. É justamente esse ponto que os autores abordam com uso das ferramentas do direito econômico.
Tirando por base o modelo do homo economicus que realiza ações de maneira racional e dirigidas para o melhor benefício possível, tanto autor quanto réu se beneficiariam de uma decisão que equilibrasse a assimetria da informação visto que seria possível tomarem as decisões ótimas. Na ausência desse equilíbrio, leia-se, com o despacho saneador sem distinguir os fatos controversos dos incontroversos, o natural é que as partes atuem de maneira a preservar todos os flancos identificados na petição inicial e contestação, ainda que possam entender intimamente serem incontroversos. Isso se dá por não terem condições de conhecer a opinião do juiz sobre esses mesmos pontos. Assim, para evitar possível preclusão do ato processual, acabam por solicitar produção de provas acerca de todo e qualquer fato indicado nas suas peças inaugurais da ação.
O despacho saneador, segundo a visão dos autores, não apenas orienta as partes sobre seus próprios pedidos, mas também, a respeito da percepção do magistrado. Nesse sentido, a expectativa é de que essa compreensão de todos atores do processo venha a trazer maior agilidade ao processo e acesso mais expedito à jurisdição.
Em que pese a não apresentação de pesquisas empíricas aptas a corroborar a tese, os modelos matemáticos apresentados chancelam o resultado da premissa apresentada pelo artigo. Possivelmente, a única fragilidade do paper é justamente não contar com tal estudo empírico, mas ainda assim, os modelos apresentam substância nos resultados colhidos e indicam para a mesma direção da hipótese inicial. A última etapa restante é que se buscasse justamente tal confirmação com resultados do mundo da vida.
Quando nos referimos ao Direito, cremos estar entrando em um universo subjetivista, em que são altas as chances para interpretações extensivas, abrangentes. Diz-se que ao Direito não aplicam-se as certezas da matemática, por exemplo. Não me parece ser verdade, pois através de fórmula simples e direta, o Prof. Dr. Ivo Gico Jr. e o Prof. Dr. Henrique Haruki Arake Cavalcante aplicam a um marco processual – o despacho saneador – a possibilidade de trazer mais celeridade ao processo e assim diminuir os gastos que se tem com o caminhar desse processo.
Pois bem, o despacho saneador é um momento do processo em que o juiz, de pronto, deve organizar o processo para dar prosseguimento à fase instrutória. Acontece que os magistrados brasileiros se limitam a simplesmente dar continuidade à ação, com mero despacho burocrático, quando, na verdade, poderiam se utilizar desse marco processual para dar a devida eficiência ao processo, qual seja, identificar os fatos controversos e incontroversos e informá-los às partes.
Se o juiz antecipar o que entende por controverso e o que assume ser incontroverso, informando às partes, esse momento – o despacho saneador – se tornaria o ponto em que as partes convergiriam para o mesmo entendimento acerca do que precisa ou não ser provado. Portanto, a divergência de informações – assimetria da informação – que permeia por entre as partes não mais existirá, fazendo com que elas se dediquem a provar somente o que for controverso. Com isso, haverá menos fatos a serem provados, consequentemente menos provas a serem produzidas, e por fim, mais celeridade e certeza processuais.
Além disso, ao dirimir a incerteza do terreno sobre o qual pisam às partes, podem elas decidir por realizar um acordo – já que, quando o juiz declarar o que é controverso e como ele enxerga essa controvérsia, uma das partes pode já entender que perderá a causa se houver prosseguimento da ação, e, ao realizar o acordo, diminuir seus gastos com as futuras custas processuais –, instrumento que se mostra muito protegido pelo Novo Código de Processo Civil.
Na hipótese em que o juiz se utilize do despacho saneador tal qual fora inicialmente criado, e, portanto, traga sua opinião inicial acerca dos fatos, demonstre quais fatos restaram incontroversos e quais seguem controversos, organize o processo e pergunta às partes quais provas querem produzir, dilui as incertezas e cria um ambiente processual com mais segurança jurídica.
Se a justiça visa celeridade e eficiência, buscando ao máximo desafogar o Poder Judiciário da quantidade de litígios que são protocolados todos os dias, deve-se atentar para o despacho saneador como forma de instruir as partes a respeito do pensamento do magistrado acerca do que poderá ser objeto de discussão no âmbito processual, ceifando as expectativas ilusórias de ambas as partes de que as chances de atingir sucesso ao final da ação são iguais ou mesmo superiores uma da outra. Vê-se o magistrado premido do poder de diluir sua carga de trabalho e permitir às partes que tenham mais esclarecimento acerca do que de fato será o resultado final do processo, fazendo com que tentem chegar a um acordo ou mesmo, se decidirem dar prosseguimento à ação, que a fase instrutória se limite ao que o juiz declarar como incontroverso ou que ainda necessite ser provado.
O artigo defende que o saneamento ocorrerá em duas fases, uma primeira em que solucionadas as questões processuais, e uma segunda em que delimitada a regra jurídica a ser aplicada e, em função desta, delimitadas as questões fáticas a serem provadas.
Contudo, a ordem constante no artigo 357 é inversa: a delimitação de questões de prova e a distribuição do onus da prova precedem a delimitação das questões de direito.
Pode-se considerar inconsequente esta ordem de ideias? Ou seria uma disposição a um modelo inquisitório, permitindo ampla instrução probatória para que sejam possível ‘dar os fatos’ ao juiz que ‘devolveria o direito’, em uma reeleitura do brocardo latino?
Em suma, talvez o caminho sugerido pelo código seja indutor de mais custos ao processo, não necessariamente buscando a eficiência.